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sábado, abril 29, 2006

passo a palavra..



A enormidade de trabalhos a realizar nas proximidades de um fim de semestre é sempre estonteante, que somado com a preparação para exames que também estão ao virar da esquina do tempo, elevam a sanidade mental de qualquer alma a um exponencial vertiginoso.

Por estas razões e também por uma deslocação à ilha do gelo em momento inoportuno, passo a palavra a quem dela tem o dom. A seguinte crónica é da autoria do Nuno Markl, no Há vida em Markl de 15.11.2005. Em prol do nosso fantástico Jet7!

"Johannes Gensfleisch Zur Laden Zum Gutenberg. Nascido
em 1398. Presume-se que tenha falecido a 3 de
Fevereiro de 1468. Um operário metalúrgico e inventor
alemão, a quem se deve, na década de 1440, a invenção
da imprensa. O poder da criação de Gutenberg seria
demonstrado em 1455, ano em que o inventor editaria a
famosa Bíblia em dois volumes.

Sim, a Bíblia de Gutenberg tornou-se num marco notável
na História das palavras impressas. Até ao passado
fim-de-semana.

No passado fim-de-semana, o semanário português O
INDEPENDENTE publicou, discretamente, no seu
suplemento VIDA, uma coluna de opinião da autoria de
Catarina Jardim. Quem é Catarina Jardim? Nada mais,
nada menos do que a popular Pimpinha Jardim. Que fica
desde já a ganhar a Gutenberg neste ponto – Gutenberg
não tinha nenhum nome de mimo. Ele era capaz de gostar
de ter um nome de mimo – não deve ser fácil ser
Johannes Gensfleisch Zur Laden Zum Gutenberg – mas
creio que ainda não era muito comum, na Alemanha do
século XV, atribuirem-se nomes de mimo. Muita sorte se
alguma das namoradas lhe chamou alguma vez JOGU, o
único diminutivo aceitável de Johannes Gutenberg. E
mesmo assim não é muito aceitável, porque soa
demasiado próximo a iogurte, e isso é uma indústria
completamente diferente daquela na qual Gutenberg se
movia.

Voltemos então a Catarina Jardim e à sua coluna no
jornal. O título do artigo é TODOS A BORDO, e trata-se
– como o nome indica – de um relato detalhado sobre um
cruzeiro a África que a jovem fez.

Ela diz, no início "O cruzeiro a África foi uma
loucura, pode mesmo dizer-se que foi o cruzeiro das
festas – como alguns dos convidados chamavam ao navio
em que Luís Evaristo nos presenteou com MAIS UM BeOne
on Board". Gosto da maneira como ela fala, sem
explicações nem perdas de tempo, de pessoas e
iniciativas sobre as quais boa parte dos leitores não
faz a mínima ideia quem sejam ou no que consistem.
Nada contra – isto faz com que qualquer leitor se
sinta cúmplice e rapidamente imerso no universo
Pimpinha. Adiante.

Ficamos a saber que ela esteve em Tânger, e que a
experiência foi, possivelmente a mais marcante da vida
desta jovem. Passo a ler o que ela escreve:

"Tânger é bastante feia, muito suja e as pessoas têm
um aspecto assustador."

Nunca fui a Tânger, mas já fui a sítios parecidos e
subscrevo inteiramente as palavras de Pimpinha.
Malditas pessoas pobres, que só estragam o nosso
planeta com a sua sujidade e o seu ar assustador! É
preciso ser-se mesmo ruim para se escolher ser pobre,
quando se pode ser tão limpo e bonito. Quando se pode
ser, em suma, rico.

Eu penso que a Pimpinha acertou em cheio na raiz de
todos os problemas mundiais da pobreza. Andam
entidades a partir a cabeça em todo o mundo a pensar
nisto, andou a Princesa Diana a gastar tantas solas de
sapatos caros a visitar hospitais, capaz de apanhar
uma doença, quando nós temos a Pimpinha com a solução.
Se calhar basta lavar estas pessoas, e talvez –
acompanhem-me neste raciocínio; Pimpinha vai ficar
orgulhosa de mim – se calhar basta lavar estas
pessoas, e em vez de gastar rios de dinheiro a mandar
comida para África, porque não os Médicos Sem
Fronteiras passarem a andar munidos de botox. Botox!
Reparem: não é fazer cirurgias plásticas a toda esta
gente feia que vive nestes países, porque isso seria
demais. Mas, que diabo – botox? Vão-me dizer que não é
possível ir de vez em quando a estes sítios e dar
botox a estas pobres almas? Como o mundo ficaria mais
bonito.

Adiante. Pimpinha desabafa, dizendo, sobre as pessoas
de Marrocos, "apesar de já ter viajado muito, nunca
tinha visto uma cultura assim – e sendo eu loura, não
me senti nada segura ou confortável na cidade".
Talvez. Mas vamos supor que trocavam Pimpinha por,
vamos supor, 10 mil camelos. Era um bom negócio para o
Independente. Dos 10 mil, escolhia, vamos lá, 2 para
passar a escrever a coluna – o que poderia trazer
melhorias significativas de qualidade – e ainda ficava
com 9 mil 998. O que, tendo em conta que Portugal está
a ficar um deserto, pode vir a revelar-se um
investimento de futuro.

Pimpinha prossegue: "Já em segurança, animou-me a
festa marroquina, com toda a gente trajada a rigor".

Suponho que, para a Pimpinha Jardim, "uma festa
marroquina com toda a gente trajada a rigor", tenha
sido assim tipo uma festa de Halloween, tendo em conta
que os marroquinos são – como a colunista diz umas
linhas acima – gente feia como nunca se viu.

Adiante. Ela diz: "A seguir ao jantar, mais um festão
que voltou a acabar de madrugada". Calma –
esclareçam-me só neste aspecto, para eu não me perder.
Portanto, houve uma festa, não é? E a seguir, outra
festa. OK. Uma pessoa corre o risco de se perder
nestes cruzeiros, com toda esta variedade de coisas
que acontecem.

Diz Pimpinha: "Desta vez não deu mesmo para dormir já
que fomos expulsos dos camarotes às 9 da manhã, para
só conseguirmos sair do navio lá para as 14 horas.
Tudo porque um marroquino se infiltrara no barco e
passara uma noite em grande, uma quebra inadmissível
na segurança".

Ora bom. Ora bom, ora bom, ora bom, ora bom.

Portanto, aqui a questão é: viagens a Marrocos e
festas com pessoas vestidas de marroquinos, tudo bem.
Agora, se pudessem NÃO ESTAR LÁ os marroquinos, isso é
que era jeitoso. Malditos marroquinos, sempre com a
mania de estarem em Marrocos. E como é que acontece
esta quebra de segurança? Eu compreendo o drama de
Pimpinha. É que o facto da segurança deixar entrar um
estafermo marroquino vestido de marroquino, numa festa
com gente bonita vestida de marroquina, isso só vem
provar que, se calhar, os amigos da Pimpinha não são
assim tão mais bonitos do que essa gente feia de
Marrocos. E isso é coisa para deixar uma pessoa
deprimida. Temos nós a nossa visão do mundo tão
certinha e de repente aparece um marroquino e uma
brecha na segurança… Enfim – nada que uma ida às
compras não resolva, ao chegar a Lisboa, certo,
Pimpinha?

Adiante. Diz Pimpinha: "Já cá fora esperava-nos um
grupo de policias com cães, para se certificarem de
que ninguém vinha carregado de mercadorias ilegais – e
não sei como é que, depois de tantos avisos da
organização, ainda houve quem fosse apanhado com droga
na mala!"

DROGA? NUMA FESTA DO JET SET PORTUGUÊS? NÃO! COMO?
NÃO. Recuso-me a acreditar. Deve ter sido confusão,
Pimpinha. Era oregãos. Era especiarias.

Pimpinha Jardim declara: "Mas o saldo foi bastante
positivo. Aliás, devia haver mais gente a arriscar
fazer eventos como estes".

Gosto desta Pimpinha interventiva. Sim senhor, diga
tudo o que tem a dizer. Faça estremecer o mundo. E com
assuntos que valham a pena. Aliás, era capaz de ser
uma boa ideia escrever um e-mail ao Bob Geldof a
tentar fazê-lo ver que essa história de organizar
concertos para combater a pobreza em África… Para quê?
Geldof devia começar era a organizar concertos para
chamar a atenção do mundo para a falta de cruzeiros
com festas. Isso é que era. Mania das prioridades
trocadas. Que maçada.

Mesmo no final, a colunista remata dizendo: "Devia
haver mais gente a arriscar fazer eventos como estes –
já estamos todos fartos dos lançamentos, "cocktails" e
festas em terra".

Aprecio aqui duas coisas: a utilização do "já estamos
todos", como se Pimpinha voltasse a acolher o leitor
no seu regaço como que dizendo: "Sim, tu és dos meus e
também estás farto de lançamentos, 'cocktails' e
festas em terra. Excepto se fores marroquino, leitor.
Se for esse o caso, por favor, exclui-te deste 'todos'
ou então vai tomar banho antes, e logo se vê".

Depois, é refrescante saber que Pimpinha está farta de
lançamentos, 'cocktails' e festas. Eu julgava que nos
últimos dias a tinha visto em cerca de 250 revistas em
lançamentos, 'cocktails' e festas, mas devia ser outra
pessoa. Só pode ser. Confusões minhas.

Em suma: finalmente, há outra vez uma razão para ler O
INDEPENDENTE todas as semanas. Tardou, mas não falhou.
Pimpinha Jardim é a melhor aquisição que um jornal já
fez em toda a História da Imprensa mundial."


2 comentários:

simplesmente espectacular o teu texto!!

acho que devias enviá-lo ao jornal para que o publicassem.

bjs,
merche
por Blogger merche, Às 9:20 da manhã  
Olá Merche,
o texto não é meu, por muito que não me importasse que fosse :) O autor é o Nuno Markl, que presumo que saibas quem é.
bjs.

Tens algo a dizer?